Associação de juízes vê inconstitucionalidade em norma que alterou o sistema de previdência social

Créditos: Banco de imagens do STF

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), propôs AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI 6256) com pedido de urgência, para que seja declarada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a inconstitucionalidade do § 3º do artigo 25 da Emenda Constitucional nº 103, de 2019, que alterou o sistema de previdência social.

Para AMB, a Emenda viola o artigo 5º, inciso XXXVI, o artigo 60, § 4º, inciso IV, da Constituição da República de 1988, e o artigo 4º da Emenda Constitucional nº 20, de 1998, que também fez mudanças na previdência no Brasil.

Para entendermos, o § 3º do artigo 25 da Emenda Constitucional nº 103, de 2019, considera nula a aposentadoria que tenha sido concedida ou que venha a ser concedida por regime próprio de previdência social com contagem recíproca do Regime Geral de Previdência Social.

Ou seja, não faz distinção na declaração de nulidade as aposentadorias concedidas ou que venham a ser concedidas com averbações de tempo de serviço previstos em leis específicas ou anterior à Emenda Constitucional nº 19, de 1998, que, por imposição da Constituição, equivale a tempo de contribuição.

É com base no pressuposto acima que a ação foi ajuizada.

Da abolição de cláusula pétrea

Para a associação a inconstitucionalidade da abolição de cláusula pétrea, “consistente na anulação irrestrita de aposentadorias”.

Isto porque, o texto da EC 103/19, estabelece que aposentadorias concedidas – ou que venham a ser concedidas – pelo Regime Próprio, quando há contagem recíproca do Regime Geral, seria nula. Vejamos o texto em sua literalidade:

“Art. 25

[…]

§ 3º Considera-se nula a aposentadoria que tenha sido concedida ou que venha a ser concedida por regime próprio de previdência social com contagem recíproca do Regime Geral de Previdência Social mediante o cômputo de tempo de serviço sem o recolhimento da respectiva contribuição ou da correspondente indenização pelo segurado obrigatório responsável, à época do exercício da atividade, pelo recolhimento de suas próprias contribuições previdenciárias.”

Do direito adquirido

O órgão representativo salienta que o direito adquirido e o ato jurídico perfeito são direitos individuais fundamentais, e demonstra segurança jurídica.

No mesmo sentido, afirma que a quebra desse compromisso constitucional, não é permitido. Mesmo que passe a ser disciplinado em outro artigo da Constituição, uma vez que o texto constitucional proíbe a abolição dos direitos e garantia individuais já consagrados.

Os advogados da associação assim escreveram:

“O direito adquirido e o ato jurídico perfeito são direitos individuais fundamentais, corolários da segurança jurídica, cuja ruptura não é admitida mesmo que o veículo seja emenda constitucional (Constituição de 1988, artigo 60, § 4º, IV).”

E, argumenta sobre os prejuízos trazidos pelo § 3º do artigo 25 da Emenda Constitucional nº 103, de 2019.

Ressalta que “Até a publicação da EC 20/98, os fatores a serem observados para fins de aposentadoria eram a idade e o tempo de serviço.

Rememorou ainda que somente após o início da vigência da EC 20/98 é que passou a ser necessária a comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias.

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Reforçou que a mudança àquela época inserida na Constituição preservou os direitos para fins de aposentadoria. Pois considerou o tempo de contribuição e o tempo de serviço anterior à obrigatoriedade de comprovação das contribuições, conforme fragmento abaixo:

“Art. 4º – Observado o disposto no art. 40, § 10, da Constituição Federal, o tempo de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até que a lei discipline a matéria, será contado como tempo de contribuição. (grifou-se)”

Enfatiza que mesmo com mudanças relevantes, impostas pela Emenda Constitucional nº 20/1998, prevaleceu o princípio da segurança jurídica. Ao respeitar situações já consolidadas anteriormente ou previstas em leis específicas vigentes. A esse respeito, assim disseram os patronos na peça ajuizada:

“Não obstante a mudança substancial no regime, a Emenda Constitucional nº 20/1998, em homenagem ao princípio da segurança jurídica, respeitou as situações já consolidadas anteriormente ou previstas em leis específicas vigentes, já que seria ilegítima a exigência da prova das contribuições pretéritas, quando a Constituição e a legislação vigente consideram suficiente a demonstração do serviço realizado (especialmente em razão das dificuldades encontradas nessas profissões liberais).”

Ressalta que mesmo a Emenda Constitucional nº 20/1998, havendo alterado a Constituição para impedir a contagem de tempo de contribuição fictício, foi mantido os direitos adquiridos, no sentido de equiparar a tempo de contribuição o tempo de serviço.

“Não obstante alterar o texto constitucional para impedir a contagem de tempo de contribuição fictício, o artigo 4º da EC nº 20/1998 equiparou a tempo de contribuição o tempo de serviço, preservando os direitos adquiridos antes da expressa vedação. Da mesma forma, preservou o direito ao cômputo do tempo de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até que a lei discipline a matéria (no caso de magistrados e promotores de justiça, as respectivas leis complementares e orgânicas mantêm a previsão de averbação do tempo de advocacia).”  

Sobre a proibição da contagem de tempo de contribuição fictício, os defensores citam o entendimento da doutrina de Marçal Justen Filho[1], que assim leciona:

“A vedação à contagem de tempo de contribuição fictício: Ademais disso, é proibido produzir contagem de tempo de contribuição fictício. Assim, as regras tais como a de que o sujeito que deixar de gozar de licença poderá contar o período em dobro devem ser reputadas como proscritas. A regra geral é de que não se computa tempo de serviço sem a efetiva ocorrência de contribuição. Mas essa determinação não impede a fruição pelo interessado de eventual direito adquirido antes da consagração de vedação constitucional sobre o tema.”

Com argumentos nesse sentido, a Associação, afirma que o § 3º do artigo 25 a Emenda Constitucional nº 103, de 2019, viola as cláusulas pétreas do direito adquirido, ato jurídico perfeito e segurança jurídica. E continua “refletidas aqui no direito fundamental e social à previdência digna, pois pretende anular as situações constituídas sob a égide do artigo 4º da Emenda Constitucional nº 20.”

Sobre o assunto até aqui trado, qual seja, novas regras previdenciárias, lembro-me que ainda quando a presença nos bancos acadêmicos era minha atividade primeira, debrucei-me sobre a doutrina de BANDEIRA DE MELLO, que assim consignara:

“[…] Segundo entendemos, as novas regras previdenciárias podem sim, em princípio, ter aplicação imediata, desde que para o futuro. O que não podem é retroagir para desconstituir direito adquirido ou desconsiderar, em termos absolutos e irrazoáveis, os chamados direitos em processo de aquisição, fazendo tábula rasa do tempo que o segurado já percorreu de acordo com as normas que vigorarem até a mudança do sistema.”    

Os patronos da ação em comento, igualmente, valeram-se do magistério do mestre Celso Antonio Bandeira de Mello[2], o qual ao lecionar sobre a transição entre regimes previdenciários, com a maestria que lhe é intrínseca, “aborda como se deve dar o balanço entre as inovações legislativas e a garantia de não violação de cláusulas pétreas, sendo necessário resguardar a juridicidade das relações constituídas ”. Ou seja:

[…] fatos pretéritos, mas que se encartam em situações ainda em curso, podem e devem ser tratados de maneira a se lhes reconhecer a significação jurídica que tiveram em face da regra precedente, sem com isto afronta-se a regra nova ou negar-lhe imediata vigência. Basta compatibilizá-los de sorte a atribuir a tudo que passou o valor jurídico que lhe correspondeu até o tempo da sobrevinda da nova lei e atribuir a tudo que transcorrerá a partir desta última os efeitos que resultam de seu tempo de império. Vale dizer: reconhecer-se – o que é incontendível – a força modificadora da regra nova em relação ao regime anterior, sem, com isto, fazer ‘tabula rasa’ da disciplina pretérita […] cada ano de serviço possui uma significação de direito perante a norma então vigente. Esta significação é a relação entre o período vencido e o período total requerido para que se integralize o direito a se aposentar. A superveniência de outra norma encontra significações já existentes e, dentre elas, está a que se aludiu. Por força das disposições novas certamente o servidor não poderá se aposentar antes de 35 anos de serviço, mas tais disposições não podem desconstituir o significado jurídico que os 20 anos passados tiveram sob o império da lei do tempo em que transcorreram sem com isto estarem incursas em retroação. Ou seja: se ele tinha, pois, 2/3 do tempo necessário para a aposentação, ele continuará a ter estes 2/3, já agora dos 35 anos que passaram a ser requeridos. (…). Em razão disso, recusar aos fatos passados o relevo que um dia tiveram perante uma norma equivale a recusar-lhes a única densidade que possuíam perante o Direito. Em uma palavra: equivale a desconstituir a juridicidade, a expressão ‘de jure’, que fazia deles um elemento do universo jurídico. Em outros termos, negar o valor que então possuíam é pura e simplesmente fazer retroagir a nova regra, sem o que seria impossível infirmar o alcance que dantes possuíam”[3].

No final, pedem os advogado o STF reconheça as  violações aos artigos 5ª, inciso XXXVI, 60, § 4º, inciso VI, da Constituição da República de 1988, e ao artigo 4º da Emenda Constitucional nº 20, de 1998, pedem a procedência dos pedidos para confirmar a cautelar deferida e declarar a inconstitucionalidade do § 3º do artigo 25 da Emenda Constitucional nº 103, de 2019, ou sucessivamente, dar interpretação conforme à Constituição ao § 3º do artigo 25 da Emenda Constitucional nº 103, de 2019, a fim de que seja excluída qualquer exegese que pretenda aplicar a regra impugnada para as aposentadorias concedidas e a serem concedidas com averbação de tempo de serviço anterior à Emenda Constitucional nº 20, de 1998.

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[1] MARÇAL, Justen Filho. Curso de direito administrativo. 10. Ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. p.1015.

[2] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Parecer. In: MODESTO, Paulo (org.). Reforma da Previdência: análise e crítica da Emenda Constitucional n. 41/2003 (doutrina, pareceres e normas selecionadas). Belo Horizonte: Ed. Fórum, 2004, páginas 431-452. Apud MODESTO, Paulo. A reforma da Previdência e a espera de Godot (parte 2). Disponível em <https://www.conjur.com.br/2019-mai-09/interesse-publico-reformaprevidencia-espera-godot-parte#_edn13&gt;

[3] Obra já citada



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